Aranauan, Saravá, Manah, Motumbá, Kolofé, Axé... Quero pedir escusas a todos os Irmãos para, mais uma vez, externar algumas reflexões importantes sobre a última publicação de Pai Rivas em seu blog (www.sacerdotemedico.blogspot.com): "Convergência Filosófica Religiosa"). Já de antemão peço desculpas pelo tom acadêmico demais das linhas que seguem... 1. Muitas pessoas pensam que o mote de aproximação da Filosofia, da Ciência, da Arte e da Religião não passa de um discurso politicamente correto, de bom tom ou apenas um slogan agradável aos olhos e aos ouvidos. Por isso, durante um certo tempo de gestação e maturação de algumas ideias, cheguei a uma conclusão (provisória como quase todas as demais): não, esse mote não é apenas uma frase de efeito; muito mais do que isso, a unidade interdependente dos Quatro Pilares do Conhecimento Humano é algo que se impõe necessariamente à razão. E minhas reflexões foram seguindo por esse caminho, até que percebi o seguinte: é absolutamente impossível existir qualquer divergência ou oposição contundente entre Filosofia, Ciência, Arte e Religião dignas desses nomes. 2. Essa conclusão está embasada em uma premissa lógica autoevidente: "só é possível haver divergência quando se fala da mesma coisa, por meio da mesma linguagem e com as mesmas finalidades". Ora, a Filosofia, a Ciência, a Arte e a Religião abordam a realidade de modos distintos, seus objetos de experiência estão localizados em planos distintos, seus métodos e suas linguagens são radicalmente distintos, as finalidades e objetivos que cada uma cumpre na dinâmica existencial do homem também são distintos e, finalmente, as estruturas da personalidade humana que são predominantemente ativadas por cada uma delas são também diferentes. Daremos um enfoque mais dirigido ao famoso "debate entre Ciência e Religião"... 3. Talvez um exemplo possa demonstrar com maior nitidez a absoluta impossibilidade de haver oposição ou incompatibilidade reais entre a Ciência e a Religião. Na Bíblia Sagrada, especificamente em seu primeiro livro, que trata da cosmogênese e da antropogênese mosaicas, há a afirmação de que a existência do homem surgiu do processo pelo qual uma "porção de barro" foi animada e vivificada pelo "sopro divino". Essa afirmação é evidentemente simbólica e metafórica (única modalidade de linguagem possível para veicular afirmações de ordem mítico-metafísica); apenas o falso "religioso" e o falso "cientista" parecem não enxergar tamanha obviedade e, por isso, ambos – apesar de se colocarem ilusoriamente em pólos opostos de um combate que é impossível – estão muito mais próximos um do outro do que poderiam supor, já que partem da mesma premissa equivocada: a de que Moisés, em sua profunda e sublime cosmovisão, pretendeu dar uma explicação materialista, objetiva, literal e biológica do surgimento da vida, única hipótese em que seria antagônica à ciência, já que apenas nessa hipótese estaria inserida no mesmo "plano" da Realidade em que se encontra o objeto das pesquisas científicas. A diferença entre ambos – o falso "religioso" e o falso "cientista" – reside apenas nas respectivas conclusões equivocadas (porque partem de um indisfarçável erro lógico anterior) que um e outro tiram do equívoco que cometeram desde o princípio: (a) de um lado, o falso "religioso" conclui que tudo o que a ciência sustentar de modo mais ou menos diferente em relação à acepção literal que tem do criacionismo bíblico é falso porque o texto sagrado, para si, assumiu a condição de literalmente verdadeiro, substituindo-se o simbolizado espiritual pelo símbolo material (o que demonstra a degeneração religiosa de nossos tempos, devido ao fato de que a maior parte de seus integrantes ainda não entendeu a regra elementar de que "a palavra mata e o espírito vivifica"...); e (b) de outro lado, o falso "cientista", por sua vez, conclui que Moisés foi uma espécie de "pré-cientista", que, explicando como pôde a origem da vida, errou fragorosamente apenas porque não teve acesso ao instrumental técnico necessário para refutar, a tempo, a própria tese. 4. Portanto, só é possível existir "debate", "confronto" - no bom sentido dos termos - no domínio interno de cada Pilar. Por exemplo: no domínio interno da Ciência, os postulados e as conclusões darwinistas se opõem de modo conflitivo e contraditório aos lamarckianos, porque ambos estão inseridos no contexto próprio da ciência e procuram investigar o mesmo fenômeno, através da mesma metodologia (científica); é também possível que, ainda no âmbito científico, a tese heliocêntrica pretenda e consiga desmentir a tese geocêntrica; mas nenhum cientista é capaz de, por meio de seus conhecimentos técnicos, oferecer a mais mínima objeção a qualquer narrativa mítica, religiosa etc., já que esta se encontra em um outro plano epistemológico e diz respeito a um estatuto ontológico evidentemente distinto do que aquele que é próprio da ciência. Ainda exemplificando: no domínio da religiosidade, um budista pode contestar o "Deus pessoal" das tradições abraâmicas ou que um hinduísta contrarie a tese kardecista de que os espíritos foram criados simples e ignorantes, já que há conformidade epistemológica entre uma tese e outra; porém, nem o budista, nem o cristão, nem o hinduísta, nem o kardecista poderão, por meio de referências míticas ou símbolos religiosos, contestar conclusões tiradas por cientistas quanto, por exemplo, à idade do planeta Terra, à dinâmica da evolução das espécies ou à fisiologia da fotossíntese. 5. Por fim, há outra conclusão interessante: uma pedra pode ser abordada pelo homem de forma científica (e aqui a sua pesquisa o fará entender como se organiza a estrutura atômica da pedras, o fará classificar as pedras em graníticas, sedimentares etc.) e ao mesmo tempo também pode ser abordada de forma religiosa (e aqui sua mente passará a percorrer idéias como coesão, força, vigor, estabilidade, firmeza, vitória sobre o tempo etc.). Ou seja: um mesmo objeto pode ser entendido pelo mesmo homem de formas diferentes, mas não antagônicas. Talvez seja essa a razão de ser do velho adágio esotérico: "A complexidade do objeto exige a integridade do sujeito". Ou seja: a Realidade é complexa demais para que seu entendimento e sua vivência sejam mutilados pelo sectarismo e pelo reducionismo. Pois isso seria, para o homem, morrer um pouco... (Discípulo de Mestre Arhapiagha) |