terça-feira, 15 de novembro de 2011

Ensaio de reflexões sobre o Congresso promovido pela FTU

Aranauan, Saravá, Axé!

Como perfeitamente colocado pelo Caboclo 7 Espadas, este ano, a FTU encerra e abre mais um ciclo com o IV Congresso Brasileiro de Umbanda do Século XXI/ I Congresso Internacional das Religiões Afro-americanas. Alguém poderia perguntar, mas como o Caboclo? Antes de responder, vamos ver como foi este evento acadêmico paradigmático...

Não nos ateremos ao conteúdo detalhado das palestras e comunicações dos Grupos de Trabalho, pois eles já estão parcialmente publicados na Revista Teologia da Convergência e o restante do material completo, sairá na próxima publicação do ano que vem. Maiores informações: http://www.ftu.edu.br/revista/

Contudo, a vivência... Que vivência! Já na sexta, o prof. Rolf Prade nos apresentou os avanços da genética para compreender estes processos elementares da vida e fiquei com a sensação de ao olhar as engrenagens da vida orgânica, ficamos mais próximo do espírito. Afinal, a primeira é concretização do segundo... Esta palestra do congressista ocorreu dentro do templo que fora especialmente preparado para receber o Congresso. Quando chegar fotos, divulgamos.

No sábado, um dia muito especial. Recebemos pela manhã o prof. Silas Guerriero  – coordenador do curso de pós-graduação da PUC-SP em Ciências da Religião. Ao lado de sua esposa, conversou longamente com os organizadores do evento antes da palestra e demonstrara alegria em poder compartilhar reflexões acadêmicas com todos os presentes. Em sua fala, abordou com clareza o problema do termo religião e as possibilidades de ângulos de interpretação para compreensão mais ampla do conceito.

Na sequência tivemos os GTs dos professores Sérgio Junqueira, representado pelo prof. Luis Alberto (um "indiozão" de quatro costados!), profa. Maria Helena Concone (renomada pesquisadora das Religiões Afro-brasileiras) e profa. Irene Dias (Coordenadora do curso de pós-graduação em Ciências da Religião da PUC-GO). Ao conversar com todos os professores, foi unânime a surpresa positiva pela qualidade dos trabalhos. Principalmente a dos alunos e professores da FTU, se considerarmos a novidade que são no espaço acadêmico. Aliás, isto ficou registrado em público quando a faculdade reuniu os coordenadores para realizarem uma síntese dos trabalhos apresentados.

Após um belíssimo almoço preparado pelo povo do santo, retornamos ao Congresso para ouvir atentamente as palavras do Pai Rivas. Mais uma vez, um sacerdote em pleno espaço acadêmico discutindo em condições de igualdade com cientistas renomados. A partir do tema Teologia do Ori/Bará, uma séria de aspectos religiosos e acadêmicos foram aproximados para se (re)pensar Religiões Afro-americanas em perspectivas mais profundas, onde a Espiritualidade é encarada como algo inerente a todo ser humano, vivente em seu interior, nas palavras do autor. Nas considerações feitas pela plenária, não podemos esquecer a fala do prof. antropólogo Norton da UFMA, quando comentou a sabedoria incutida na ideia de relacionar o Ori/Bará com a Espiritualidade fazendo uso de avanços da psiquiatria e psicanálise.

Seguindo com a programação de sábado, fomos brindados com as palavras do professor Sérgio Ferretti. Ao evocar as festas de santo, por meio de seu rigor descritivo em texto, fotos e vídeos, sentimos penetrar nos sentidos o Tambor de Mina. A emoção tomou conta da plenária.

Se não bastassem as atividades até então realizadas, Pai Rivas convidou todos os professores ainda presentes no Congresso para conhecerem o Centro de Cultura Viva das Religiões Afro-brasileiras. Acompanhando-O, foram, além de mim, alguns de seus filhos espirituais, Mundicarmo Ferretti, Sérgio Ferretti, Irene Dias e dois orientandos, Hulda (que estuda intolerância religiosa na comunidade do povo do santo) e Oli (pesquisa o tema "Exu").

Ao passar pelo Ajubó dos Orixás, explicando cada Orixá e Exu relacionado, Pai Rivas apresentava um saber sacerdotal que era possível ser compreendido pelos acadêmicos, pois o decodificava e traduzia para uma linguagem crítica. Naquela experiência, comprovamos que o diálogo entre Ciência e Religião não só é possível, como ocorreu de fato. Momentos seguintes, passamos pelo assentamento de Oxaguian, orixá da casa, e os professores puderam conhecer tanto a Camarinha quanto o Ilê Ifá.

Antes de irmos embora, é claro, não poderíamos deixar de louvar os Mestres na Encantaria. E louvando-Os, cantando as louvarias, ladainhas, doutrinas, passamos por várias regiões do país, penetramos no seio dos genes espirituais do povo brasileiro: a diversidade! Igualmente importante foi a evocação do Mestre Canindé, Rei da Turquia, Dom Sebastião, Sereinha e tantos outros Ancestrais que acostam nos inúmeros templos da Região Norte, Nordeste. Ao cantar e tomar jurema, ao celebrarmos a vida, vivenciarmos o Tambor de Mina, o Terecô e a Pajelança, além do Toque de Jurema, foi a vez dos Ferrettis sentirem-se um pouco mais próximos do Maranhão!

No dia seguinte, último do Congresso, prof. Volney fez a exposição teórica do que sentimos ao trabalhar na FTU: experiência religiosa e teologia. Uma fala segura, consistente, que abriu portas para a reflexão de que uma sociedade multirreligiosa prescinde de um diálogo inter-religioso real, não apenas idealizado. E que a prática deste diálogo, passa pelos pressupostos da experiência religiosa. Uma crítica teológica muito pertinente. Tanto é verdade que a FTU com o conceito de Escolas e Umbandização procura fazer isto no ambiente intra-religioso e no aspecto inter-religioso, recebe vários teóricos e sacerdotes de outras denominações.

Logo depois, tivemos a sequencia dos GTs. Dada a quantidade de inscrições, o GT da profa. Maria Helena fora dividido em dois e professor Sérgio Ferretti coordenou um dos grupos. Para fazer a síntese, a profa. Maria Helena convidou o Pai Rivas. Mais uma vez a qualidade dos trabalhos foi evocada por todos os coordenadores. Isto nos alegra muito, pois mostra que a FTU já é um centro de referência e produção acadêmica na área de Teologia com ênfase nas Religiões Afro-brasileiras e Tradição Oral.

Após uma excelente lasanha que comi entre outros pratos no almoço oferecido pela FTU, assistimos a fala do professor Wagner Sanches, que trouxe a teologia para encarar problemas sociais, provocando este saber acadêmico para ser mais pragmático. Enfrentar objetivamente questões que nem sempre são de fácil solução. A profa. Mundicarmo deu início ao encerramento do evento evocando os Caboclos, os Reis Encantados e provocando outros olhares sobre estes Ancestrais que são tão especiais para nós das Religiões Afro-brasileiras.

Quando afirmamos início ao encerramento, não mentimos. Duas horas depois do término formal do congresso, lá estávamos dentro do terreiro cantando para os nossos Ancestrais. Qual não foi a nossa surpresa, quando Pai Joaquim incorporou em Pai Rivas e nos deu bênçãos que emocionaram coletivamente. Emoção esta que foi amplamente aprofundada com a perfeita incorporação do Caboclo 7 Espadas.

Confesso que chorei, chorei muito. Chorei de alegria pelo sucesso do Congresso, chorei de felicidade pelo projeto da FTU idealizado por Pai Rivas e seus Ancestrais, chorei por ver o Caboclo que escreva livros que mudaram a minha vida e forma de pensar sobre ela. Ouvi deste mesmo Caboclo que este quarto evento marcava o fim de um ciclo e, naturalmente, o início de outro. Tenho certeza que será tão dourado quanto tudo que pude vivenciar ao lado de meu Mestre derradeiro, Pai Rivas. Mudanças estruturais estão chegando. Que bom, afinal meu Pai mesmo é quem diz: a constante da nossa Tradição é a contínua mudança. Espero (re)encontrar todos novamente no ano que vem!

E deixa a Gira girar!



Aranauan, Saravá, Axé,
Yabauara (João Luiz Carneiro)
Discípulo de Mestre Arhapiagha (Pai Rivas)



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