sexta-feira, 20 de julho de 2012

A Iniciação não admite verdades por simples conveniência

Aranauan, Saravá, Axé!

 

Sendo coerente com que escrevi ontem, vou tratar de questões realmente importantes e que permitem um diálogo com os vários adeptos das Religiões Afro-brasileiras.

 

Pegando carona no trabalho apresentado pelo nosso irmão de santé Aratish no congresso da Universität Wien (Universidade de Viena) na Áustria e a última publicação do Pai Rivas intitulada "O conceito de Escolas legitima e valoriza os processos de Iniciação nas Religiões Afro-brasileiras" (disponível em: http://espiritualidadeciencia.wordpress.com/), gostaria de discutir a ideia de indivíduos "fora-do-mundo"/"no mundo.

 

Pai Rivas faz uma leitura do antropólogo Louis Dumont e lembra que sua pesquisa apontou para um modelo de iniciação adotado no Hinduísmo onde o indivíduo que busca tal despertar objetiva uma renúncia às coisas do mundo. Aliás, a sociedade "profana" é vista como um grande óbice. Esses modelos que podemos encontrar no Budismo, na Umbanda Esotérica e em outras formas religiosas foram categorizados pelo antropólogo como "indivíduos fora-do-mundo". De igual maneira, Dumont – na leitura de Pai Rivas – aponta outra forma onde o indivíduo convive naturalmente em seus meios sociais ("indvíduos-no-mundo").


Sinceramente não estamos preocupados em escolher qual modelo é melhor. Aliás, esta classificação não cabe. Cada um busca os caminhos que julgam os melhores para si. E está tudo certo. Ocorre que isto só passa a ser um problema quando justamente quem faz uma escolha julga a sua melhor e, consequentemente, julga o diferente como pior.

 

Analisar a Umbanda Esotérica, escola a qual Pai Rivas é Mestre-Raiz, ajuda bastante na percepção destas nuances. Sua forma de iniciação é muito próxima ao citado pelo Louis Dumont quando estudou o caso na sociedade indiana. O problema é quando o filiado à Umbanda Esotérica  deturpa esse processo. Nas palavras do Mestre-Raiz desta importante Escola umbandista: "Muitos integrantes da umbanda esotérica afirmam que seu processo de iniciação é muito mais árduo, difícil. Mas questionemos, não será mais difícil quando a iniciação é processada e praticada em meio ao turbilhão de valores sociais anti-espirituais? E seria justo pensarmos apenas no nosso processo de iniciação, seria possível ser liberto quando muitos seres ainda sofrem, penam e gemem de mazelas materiais? Assim, muitas pessoas costumavam disseminar a superioridade da iniciação da umbanda esotérica frente a outras, em um discurso neo-evolucionista e preconceituoso com outras práticas".

 

Interessante que observamos isto em outras doutrinas. Quantos não citam (aliás, sem viver) doutrinas do oriente como se fossem melhores que as professadas no ocidente, aproveitando o desconhecimento do senso comum para projetar seus desejos e necessidades? É como se a doutrina oriental retirasse o sujeito do mundo ocidental "profano". Pobre falácia...

 

Falamos da Umbanda, falamos do Budismo, Hinduísmo, mas também poderíamos citar "n" outras expressões religiosas.

 

A questão é que ao achar a sua doutrina melhor ou sua Iniciação "mais difícil" quando comparado ao outro, de certa forma, cria-se uma postura que lembra a construção da "verdade por conveniência". Ou seja, se algo fala a favor do que desejo, aceito como a mais pura verdade sem questionamentos. Caso contrário, crio fugas como "não vi, então não posso afirmar" ou "tudo é relativo". O que não passam de evasivas.

 

Contudo, na exata medida em que o conceito de Escolas é inserido na visão das Religiões Afro-brasileiras, ficamos mais tranquilos. Ao aceitar as várias formas de praticar e compreender o Sagrado como legítimas, esta poderosa ideia neutraliza as hegemonias e homogenias. Todos terreiros das Religiões Afro-brasileiras passam ter voz e vez sem privilégios.

 

E deixa a Gira girar!


Yabauara


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